Era ainda criança, teria onze anos, creio, quando aprendi algo que me acompanhou toda a vida. Claro que naquele momento não o percebi, só bem mais tarde tive real noção da lição que me fora ensinada.
Em menina sempre fui sossegada, dócil, bem comportada, e muito raramente me zangava ou perdia a cabeça.
Numa aula de Geografia, em que todos os alunos estavam distribuidos em mesas redondas em grupos de seis, por alguma razão que não me lembro, aborreci-me com uma colega - que sempre me irritava...- e perdi a cabeça. Soltei a lingua, e muito zangada e de voz alterada devo ter dito aquilo que considerei umas verdades. Claro que a pobre não ficou calada, a algazarra agravou-se, e a verdade é que o professor teve que interromper a aula e achou por bem tirar-me daquele grupo e sentar-me junto a outros colegas, noutra mesa.
Não sei porque razão, mas lembro-me daquele professor dividir os grupos por aqueles meninos que tinham melhores notas, e noutras mesas colocava apenas os que tinham mais dificuldades.
Nesse dia fui parar à mesa dos meninos que muito pouco percebiam daquelas coisas, e confesso que o meu orgulho ficou muito abalado. Afinal eu até era boa aluna, e na minha cabeça infantil, estava coberta de razão.
Por ordem do professor, fui ajudando os colegas de "infortúnio", e quando demos por isso, todos naquela mesa começaram a ter as notas a subir. Eu não era mais inteligente que nenhum daqueles meninos, mas percebi que para os poder ajudar e ensinar, eu própria tinha que me esforçar por aprender.
Chegamos ao final do ano lectivo, e a nossa mesa juntou-se ao grupo dos "melhores". Foi bom para todos, claro, mas nunca esqueci que aprendera duplamente.
Por vezes, para aprendermos temos que ensinar.
Temos que percorrer em nós aqueles caminhos desconhecidos, obrigarmo-nos a crescer naquilo que é mais doloroso, para abrir caminhos livres e desimpedidos para quem espera de nós ajuda.
Acontece-nos quando nos tornamos pais, mas acredito que se estivermos atentos, podemos crescer aprendendo e ensinando pela vida fora. Basta ser humilde e compreender que não somos donos de verdades, e dar oportunidade a quem nos procura para crescer também.